REGIMENTO DO
PAU-BRASIL - 1605
Eu Ei-rei. Faço saber aos que este Meu Regimento virem, que sendo informado
das muitas desordens que lia no certão do páo brasil, e na conservação delle,
de que se tem seguido haver hoje muita falta, e ir-se buscar muitas legoas
pelo certão dentro, cada vez será o damno mayor se se não atalhar, e der
nisso a Ordem conveniente, e necessaria, como em cousa de tanta importancia
para a Minha Real Fazenda, tomando informações de pessoas de experiência das
partes do Brasil, e comunicando-as com as do Meu Conselho, Mandei fazer este
Regimento, que Hei por bem, e Mando se guarde daqui em diante
inviolavelmente.
Parágrafo 1'. Primeiramente Hei por bem, e Mando, que nenhuma pessoa possa
cortar, nem mandar cortar o dito páo brasil, por si, ou seus escravos ou
Feitores seus, sem expressa licença, ou escrito do Provedor mór de Minha
Fazenda, de cada uma das Capitanias, em cujo destricto estiver a mata, em
que se houver de cortar; e o que o contrário fizer encorrerá em pena de
morte e confiscação de toda sua fazenda.
Parágrafo 2'. O dito Provedor Mór para dar a tal licença tomará
informações da qualidade da pessoa, que lha pede, e se delia ha alguma
suspeita, que o desencaminhará, ou furtará ou dará a quem o haja de
fazer.
Parágrafo 3'. O dito Provedro Mór fará fazer um Livro por elle assignado,
e numerado, no qual se registarão todas as licenças que assim der,
declarando os nomes e mais confrontações necessarias das pessoas a que
se derem, e se declarará a quantidade de páo para que se lhe dê licença,
e se obrigará a entregar ao contractador toda a dita quantidade, que
trata na certidão, para com elia vir confrontar o assento do Livro, de
que se fará declaração, e nos ditos assentos assignará a pessoa, que
levar a licença, com o Escrivão.
Parágrafo 4'. E toda a pessoa, que tomar mais quantidade de páo de que
lhe fôr dada licença, além de o perder para Minha Fazenda, se o mais que
cortar passar de dez quintaes, incorrerá em pena de cem cruzados, e se
passar de cincoenta quintaes, sendo peão, será açoutado, e degradado por
des annos para Angola, e passando de cem quintaes morrerá por elle, e
perderá toda sua fazenda.
Parágrafo 5'. O provedor fará repartição das ditas licenças em o modo,
que cada um dos moradores da Capitania, a que se houver de fazer o
corte, tenha sua parte, segundo a possibilidade de cada um, e que em
todos se não exceda a quantidade que lhe for ordenada
Parágrafo 6'. Para que se não córte mais quantidade de páo da que eu
tiver dada por contracto, nem se carregue à dada Capitania, mais da que
boamente se pôde tirar delia; Hei por bem, e Mando, que em cada um anno
se faça repartição da quantidade do páo, que se ha de cortar em cada uma
das Capitanias, em que há mata delle, de modo que em todo se não exceda
a quantidade do Contracto.
Parágrafo 7'. A dita Repartição do páo que se ha de cortar em cada
Capitania se fará em presença do Meu Governador daquelle Estado pelo
Provedor Mór da Minha Fazenda, e Off iciaes da Camara da Bahia, e nelia
se terá respeito do estado das matas de cada uma das ditas Capitanias,
para lhe não carregarem mais, nem menos páo do que convém para benefício
das ditas matas, e do que se determinar aos mais votos, se fará assento
pelo Escrivão da Camara, e delles se tirarão Provisões em nome do
Governador, e por elle assignadas, que se mandarão aos Provedores das
ditas Capitanias para as executarem.
Parágrafo 8'. Por ter informação, que uma das cousas, que maior damno
tem causado nas ditas mattas, em que se perde, e destroe mais páos, é
por os Contractadores não aceitarem todo o que se corta, sendo bom, e de
receber, e querem que todo o que se lhe dá seja roliço, e massiço do que
se segue ficar pelos mattos muitos dos ramos e ilhargas perdidas, sendo
todo elle bom, e conveniente para o uso das tintas: Mando a que daqui em
diante se aproveite todo o que fôr de receber, e não se deixe pelos
matos nenhum páo cortado, assim dos ditos ramos, como das ilhargas, e
que os contractadores o recebão todo, e havendo dúvida se é de receber,
a determinará o Provedor da Minha Fazenda com informação de pessoas de
crédito ajuramentadas; e porque outrosym sou informado, que a causa de
se extinguirem as matas do dito páo como hoje então, e não tornarem as
árvores a brotar, é pelo mão modo com que se fazem os cortes, não lhe
deixando ramos, e varas, que vão crescendo, e por se lhe pôr fogo nas
raizes, para fazerem roças; Hei por bem, e Mando, que daqui em diante se
não fação roças em terras de matas de páo do brasil, e serão para isso
coutadas com todas as penas, e defesas, que estas coutadas Reaes, e que
nos ditos córtes se tenhão muito tento a conservação das árvores para
que tornem a brotar, deixando-lhes varas, e troncos com que os possão
fazer, e os que o contrário fizerem serão castigados com as penas, que
parecer ao Julgador.
Parágrafo 9'. Hei por bem, e Mando, que todos os annos se tire devassa
do córte do páo brasil, na qual se perguntará pelos que quebrarão, e
forão contra este Regimento.
Parágrafo 10'. E para que em todo haja guarda e vigilância, que convém
Hei por bem, que em cada Capitania, das em que houver matas do dito páo,
haja guardas, duas delias, que terão de seu ordenado a vintena das
condemnações que por sua denunciação se fizeram, as quaes guardas serão
nomeadas pelas Camaras, e approvadas pelos Provedores de Minha Fazenda,
e se lhes dará juramento, que bem, e verdadeiramente fação seus Off
icios.
Parágrafo 11'. O qual Regimento Mando se cumpra, e guarde como nelle se
contém e ao Governador do dito Estado, e ao Provedor Mór da Minha
Fazenda, e aos Provedores das Capitanias, e a todas as justiças dellas,
que assim o cumprão, e guarde, e fação cumprir, e guardar sob as penas
nelle contheudas; o qual se registrará nos Livros da Minha Fazenda do
dito Estado, e nas Camaras das Capitanias, aonde houver matas do dito
páo, e valerá posto que não passe por carta em meu nome, e o effeito
delta haja de durar mais de um anno, sem embargo da Ordenação do segundo
Livro, título trinta e nove, que o contrário dispoem. Francisco Ferreira
o fés a 12 de Dezembro de 1605. E eu o Secretario Pedro da Costa o fis
escrever "Rey".