Mineração
Rigidez
administrativa
Regimento aurífero de 1702
A descoberta das jazidas e
o início da extração aurífera no Brasil impunham a Portugal a necessidade de uma
administração mais rígida, compatível com os interesses da Coroa. Uma
administração que assegurasse os privilégios da metrópole, facilitasse a
política fiscal e impusesse absoluto controle sobre tudo o que dissesse respeito
à mineração. Enfim, uma política administrativa que recompusesse os alicerces do
pacto colonial mercantilista.
Esses foram os objetivos do governo português ao decretar o
Regimento de 1702, que alterava essencialmente as leis anteriores sobre extração
mineral na colônia.
Pelo Regimento de 1702 foram criadas as Intendências das
Minas, uma para cada capitania onde se extraía ouro. Nas zonas mineradoras as
Intendências eram autênticos governos autônomos independentes das de mais
autoridades coloniais que só prestavam obediência à Coroa.
Além de enfeixar nas mãos os poderes administrativos, fiscais e policiais, as
Intendências eram super órgãos que funcionavam como um tribunal especial onde se
julgavam os delitos relacionados à mineração.
Cada Intendência era composta por um superintendente e um
guarda-mor responsável pela distribuição e fiscalização das minas. No caso de
acúmulo de trabalho eram nomeados os guarda-menores para auxiliar o guarda-mor
em suas funções.
De acordo com o Regimento todas as jazidas pertenciam ao rei,
e o indivíduo que descobrisse uma zona aurífera deveria comunicar o achado
imediatamente às autoridades da Intendência. O minerador que procedesse
diferente seria preso e julgado por crime de lesa-majestade.
Descoberta a zona aurífera, era da competência do guarda-mor
demarcar a região e proceder à distribuição dos lotes (datas) a serem
explorados. Pelo Regimento o descobridor tinha o direito de escolher para si as
duas primeiras datas. Em seguida o guarda-mor reservava para a Real Fazenda a
terceira data, que, depois, era leiloada. publicamente. As demais datas eram
distribuídas por sorteio entre aqueles que houvessem requerido, junto à
Intendência, o direito a um lote. Os requerentes se comprometiam a iniciar a
exploração do lote no prazo determinado (quarenta dias). O Regimento determinava
expressamente que ninguém podia vender o lote recebido nem receber um segundo
lote sem antes Ter terminado a exploração do primeiro.
O tamanho das datas (lotes) variava de acordo com o número de
escravos que o pretendente possuísse. Os lotes maiores ficavam com aqueles que
possuíssem no mínimo doze escravos. Dessa maneira o governo português
privilegiava os mais capazes economicamente.
Lavras e faisqueiras
A
exploração aurífera no Brasil se estruturou em duas modalidades de extração: as
lavras e as faisqueiras.
As lavras eram grandes unidades de extração formadas por
importantes jazidas. Esses estabelecimentos auríferos exigiam, para sua
exploração, um grande número de escravos e um volume de capital razoável.
As faisqueiras eram unidades menores onde a extração do ouro
era feita por garimpeiros que trabalhavam sozinhos ou com um pequeno número de
escravos. Seus componente; usavam técnicas e equipamentos inferiores aos
geralmente utilizados nas lavras.
Na segunda metade do século XVIII, o predomínio de
faisqueiras sobre o número de lavras é explicado pelo declínio das grandes minas
e a predominância do ouro de aluvião, encontrado nas areias e nos cascalhos dos
rios e dos riachos.
Havia faisqueiras tão pequenas que eram exploradas por um
único faiscador. E havia casos em que o dono de uma faisqueira enviava um ou
alguns negros de sua propriedade para extrair ouro, em troca de uma porcentagem
do metal encontrado. Isto, teoricamente, possibilitava a alguns negros a compra
da liberdade.
Extração de diamantes
Estarmos
nas primeiras décadas do século XVIII. Que pedrinhas brancas e tão brilhantes
são essas que vêm junto com as pepitas de ouro nas bateras? Ninguém sabia a
resposta. Eram diamantes.
Foi necessário que algumas dessas pedras chegassem às mãos de
uma pessoa que estivera no Oriente e conhecera o diamante para que as
"pedrinhas" se tornassem notícia. Quando em 1729 a notícia de sua existência em
Serro Frio se espalhou pelas zonas mineradoras, começou uma verdadeira corrida
para a região. Intensificada a procura, o diamante foi descoberto em maior
quantidade no Arraial do Tijuco, hoje Diamantina (MG).
Descoberto o valor econômico do diamante, o governo português
mandou demarcar a principal área de exploração, surgindo assim o Distrito
Diamantino.
Como ocorria em relação às minas de ouro, as de diamantes também pertenciam ao
rei, e só a Coroa podia conceder a particulares o privilégio de exploração, sob
obrigação de efetuar os pagamentos das taxas e tributos impostos pelo governo
lusitano.
Pouco mais tarde Portugal alterou a política sobre a extração
do diamante, passando a conceder os direitos de exploração a um único indivíduo:
o contratador, que exercia autoridade plena sobre os moradores do Distrito e só
prestava obediência à Intendência dos Diamantes.
A rígida fiscalização sobre o Distrito Diamantino impunha um
absoluto controle sobre as pessoas que nele entravam ou saíam. Os escravos que
trabalhavam na extração do diamante eram vigiados e revistados por um número de
vigias bem superior ao número de negros. Apesar disso o roubo e o contrabando
eram constantes.
Em 1771 o marquês de Pombal extinguiu o sistema de contrato e
determinou que a exploração do diamante seria feita pela Coroa.
Tributação sobre a
mineração
Em relação
à cobrança de impostos o Regimento de 1702 estipulava que a quinta parte de todo
o ouro extraído no Brasil era da Coroa. Este imposto era conhecido como o quinto
e estava de acordo com as normas tributárias da época.
Por determinação real, a cobrança do quinto seria feita nas
Casas de Fundição. A idéia de se criar as Casas de Fundição já datava do início
do século XVII, mas somente no final desse século elas foram inauguradas no
Brasil.
Nas Casas de Fundição a cobrança do quinto era facilitada,
pois o ouro que lá chegava era fundido em barras timbradas com o selo real.
Ainda antes da fundição a quinta parte era retirada como tributo para a Real
Fazenda. A circulação do ouro em pó foi proibida e, de acordo com a lei, só
podia circular na colônia o ouro fundido em barras.
O sistema de arrecadação nas Casas de Fundição não atingiu o
êxito desejado por Portugal, primeiro porque a sonegação era facilitada pelas
grandes distâncias entre as zonas mineradoras e as Casas de Fundição localizadas
em São Paulo, segundo porque os mineiros desobedeciam à proibição da circulação
do ouro em pó, que continuava corrente em toda a colônia. A carga tributaria
onerosa e opressiva imposta pela metrópole abrangia não só a extração do ouro,
mas todas as demais atividades na colônia. Os colonos se ressentiam das
constantes altas dos impostos, que provocavam continuadas altas nos preços dos
artigos por eles consumidos.
A abrangente política fiscal usava de todos os meios para
aumentar a arrecadação em prol do governo local ou metropolitano. Um desses
meios foi a instalação de postos fiscais em pontos estratégicos das estradas que
ligavam Minas ao Rio, a São Paulo e à Bahia. Nesses postos fiscais, também
chamados centros de inspeção, além de se fiscalizar se havia sido feito o
pagamento do quinto, cobravam-se impostos sobre a passagem de pessoas e animais
e sobre a entrada de todas as mercadorias transportadas para Minas.
Os mineiros encontravam na sonegação e no contrabando formas
ideais de "escapar" aos excessos fiscais. Há autores que afirmam que mais de 20%
do ouro exportado saiu do Brasil via contrabando. Segundo documentos da época,
muitos frades que viviam nas regiões mineiras eram responsáveis pela evasão de
grande parte dos metais preciosos. Eram tão freqüentes os abusos dos frades que
houve quem propusesse "desinfetar as Minas daqueles homens'".
Em 1730 o governo reduziu o quinto para 12%. Entretanto, para
ampliar a arrecadação foi criado, em 1735, um imposto complementar chamado
capitação. Esse imposto, extremamente amplo, exigia do minerador o pagamento de
uma taxa sobre cada um dos seus escravos. O mesmo imposto incidia sobre os
faiscadores que não tinham escravos e taxava também os donos de hospedarias,
oficinas e lojas.
Em 1750 a capitação foi abolida e retomou-se o quinto.
Contudo o governo português estipulou em 100 arrobas anuais o mínimo arrecadado.
Se essa quantia não fosse atingida processar-se-ia a derrama, isto é, a cobrança
complementar praticada em geral com requintes de violência.
Revolta de Filipe dos
Santos (Vila Rica, 1720)
A opressiva
tributação que refletia a vigorosa política fiscal da metrópole resultava, por
vezes, em violentas reações dos mineiros. Uma das reações geradas pela avidez da
política fiscal da metrópole foi a Rebelião de Vila Rica. A causa imediata do
conflito foi a determinação governamental de recriar as Casas de Fundição em
1719, com todas as implicações que isso traria para os mineradores.
Em 1720 um grupo de mineiros e escravos armados sob a
liderança do português Filipe dos Santos dominou Vila Rica. Os rebeldes
procuraram o governador, o Conde de Assumar, e lhe apresentaram uma petição com
várias exigências, entre as quais a não-instalação das Casas de
Fundição e o absoluto respeito à liberdade dos revoltosos.
O governador fingiu aceitar as exigências e prometeu tomar
providências a respeito. Contudo, o que o governador pretendia era ganhar tempo
e organizar a reação oficial. Assim que conseguiu reunir as forças militares
necessárias o governador marchou sobre Vila Rica, para onde tinham voltado os
revoltosos, crentes no seu triunfo.
Os rebeldes foram presos. Alguns foram enviados para Portugal
e Filipe dos Santos foi condenado à morte e enforcado. Depois de "garroteado",
pedaços do seu corpo foram arrastados pelas ruas e pendurados em postes. Filipe
dos Santos foi usado como exemplo. Sua morte deixava clara a incompatibilidade
entre os interesses da metrópole e os dos colonos. Com essa sua execução sumária
o governo mostrava aos colonos que todos aqueles que se rebelassem teriam a
morte como destino.
Destino do ouro brasileiro
Para melhor
compreensão do que vai ser explicado faz-se necessário retomar a exposição sobre
a situação de Portugal à época da Restauração. Se de um lado a Restauração
significou a recuperação da independência política da nação lusitana, de outro
implicou o início de um processo de dependência econômica que durou séculos.
Arruinada economicamente e sob constante ameaça da Espanha, a
Coroa portuguesa, após a Restauração, foi forçada a fazer alianças e a assinar
tratados, notadamente com a Inglaterra, nação a que Portugal ficou submetido. À
medida que Portugal ia assinando acordos com a Inglaterra, ia se acentuando a
dependência econômica em relação àquele país.
Entre tantos outros tratados destacamos dois por
descaracterizarem a nação portuguesa como nação autônoma: o Tratado de 1654 e o
Tratado de Methuen, de 1703.
Pelo Tratado de 1654 ficavam estipuladas em apenas 23% as
taxas sobre as mercadorias inglesas nas alfândegas portuguesas. Determinava
também que navios ingleses comerciassem livremente com as colônias portuguesas.
No caso do Brasil, os ingleses só não podiam comerciar com farinha de trigo,
azeite, vinho, bacalhau e pau-brasil, porque o comércio desses produtos era
monopólio da Companhia Geral de Comércio do Brasil.
Em seus três artigos, o Tratado de Methuen, também conhecido como Tratado dos
Panos e Vinhos, estipulava que:
-
"Artigo
1.° Sua Sagrada Majestade El-Rei de Portugal promete, tanto em seu próprio
Nome, como no de Seus Sucessores, admitir para sempre, de aqui em diante, no
Reino de Portugal os panos de lã e mais fábricas de lanifício de Inglaterra,
como era costume até o tempo em que foram proibidos pelas leis, não obstante
qualquer condição em contrário.
-
"Artigo
2.° É estipulado que Sua Sagrada e Real Majestade Britânica, em Seu Próprio
Nome, e no de Seus Sucessores, será obrigada para sempre, de aqui em diante,
de admitir na Grã-Bretanha os vinhos do produto de Portugal, de sorte que em
tempo algum (haja paz ou guerra entre os Reinos de Inglaterra e de França)
não se poderá exigir direitos de Alfândega nestes vinhos, ou debaixo de
qualquer outro título direta ou indiretamente, ou sejam transportados para a
Inglaterra em pipas, tonéis ou qualquer outra vasilha que seja, mais que o
que se costuma pedir para igual quantidade ou medida de vinho de França,
diminuindo ou abatendo uma terça parte do direito do costume.
-
"Artigo
3.° Os Exmos. Senhores Plenipotenciários prometem e tomam sobre si, que Seus
Amos acima mencionados ratificarão este tratado, e que dentro do termo de
dois meses se passarão as ratificações."
Não podemos
precisar com exatidão a quantidade de ouro extraído no Brasil no século XVIII,
já que grande parte foi desviada pelo contrabando e os registros são
controvertidos. Mas afirma-se que em cinqüenta anos extraiu-se mais ouro no
Brasil do que na América espanhola em 350 anos.
Isto nos permite avaliar as extraordinárias vantagens que o Tratado de Methuen
reservou para a burguesia britânica, e afirmar que ao impor ao governo português
a assinatura desse tratado os ingleses já visavam o ouro brasileiro.
Além das desvantagens comerciais, o Tratado de Methuen trouxe
uma drástica conseqüência para a nação portuguesa: o aniquilamento das
possibilidades de o país desenvolver a indústria manufatureira.
Portugal poderia ter se tomado uma potência econômica com o
ouro do Brasil, mas isso não ocorreu. Em grande parte o ouro brasileiro serviu
para a Coroa pagar suas dívidas e cobrir os prejuízos de uma balança comercial
eternamente deficitária, já que as importações superavam em muito as
exportações.
Com a mineração, "...a Inglaterra encontrou na economia
luso-brasileira um mercado em rápida expansão e praticamente unilateral. Suas
exportações eram saldadas em ouro, o que adjudicava à economia inglesa uma
excepcional flexibilidade para operar no mercado europeu. (...) Dessa forma, a
economia inglesa adquiriu maior flexibilidade e tendeu a concentrar suas
inversões no setor manufatureiro, que era o mais indicado para uma rápida
evolução tecnológica. Por outro lado, recebendo a maior parte do ouro que então
se produzia no mundo, os bancos ingleses reforçaram mais e mais sua posição,
operando-se a transferência do centro financeiro da Europa de Amsterdã para
Londres. Segundo fontes inglesas, as entradas de ouro brasileiro em Londres
chegaram a alcançar, em certa época, 50.000 libras por semana, permitindo uma
substancial acumulação de reservas metálicas, sem as quais a Grã-Bretanha
dificilmente poderia haver atravessado as guerras napoleônicas"'.
Uma sociedade em
transformação Urbanismo e mobilidade social
A sociedade
colonial brasileira do século XVIII passou por profundas transformações devido à
mineração. Já no final do século XVII a mineração atraiu para as Minas Gerais
uma imensa multidão de pessoas das mais diferentes origens, posições sociais e
situações econômicas. Pobres e ricos, brancos, índios e negros livres e
escravos, nobres e plebeus, aristocratas e burgueses, portugueses e gente de
outros países - apesar das restrições portuguesas à entrada de estrangeiros na
colônia - povoavam as terras mineiras.
A migração promoveu um extraordinário crescimento
demográfico. Calcula-se que no século do ouro entraram no Brasil 1 milhão de
negros africanos, 800 mil portugueses e centenas de imigrantes de outros países.
Dados exagerados? Não podemos precisar. Contudo não resta
dúvida que a mineração provocou uma explosão populacional. De 300 mil pessoas em
1700, passou para 3,3 milhões em 1800, o que significa que a população cresceu
onze vezes.
A sociedade que se formou nas Gerais era tipicamente urbana,
onde, ao contrário do que ocorrera com a sociedade agrária dos engenhos,
proliferaram as profissões liberais e vários tipos de ofícios: sapateiros,
alfaiates, ferreiros, pintores, entalhadores, músicos, joalheiros, barbeiros,
boticários, mercadores, taberneiros, estalajadeiros, advogados, médicos,
mestres-escolas, padres, militares, funcionários públicos, tropeiros,
prestamistas etc.
Pelo exposto é possível concluir que na sociedade mineira
havia uma melhor distribuição da renda em relação ao Nordeste açucareiro, onde a
renda estava altamente concentrada nas mãos dos senhores de engenho.
Resta dizer também que a possibilidade de se tornar senhor de
uma propriedade aurífera e enriquecer com o metal era bem maior do que a
possibilidade de ser senhor de engenho nas zonas açucareiras. Isso porque para
montar um engenho era preciso muito capital disponível para comprar equipamentos
e mão-de-obra escrava, e ainda suportar o período de carência que ia da montagem
da empresa até os primeiros lucros. A mineração não exigia equipamentos
sofisticados nem mão-de-obra numerosa. O pleiteante recebia seu lote e muitos
mineiros trabalhavam sozinhos em suas faisqueiras.
Dada a diversificação das atividades socio-econômicas -
característica das sociedades urbanas -, o desenvolvimento do mercado consumidor
interno e a melhor distribuição da renda, surgiram, na sociedade urbana da
mineração, as classes médias brasileiras, compostas por uma população
predominantemente masculina de profissionais liberais, artesãos e artífices,
como já vimos.
A existência de classes médias urbanas nas zonas mineradoras
é uma prova inconteste de que a mineração possibilitou uma mobilidade social que
não poderia ser encontrada na empresa açucareira, caracterizada por uma
hierarquização bipolar da sociedade. Escravidão e alforria
Diferentemente da empresa açucareira, a mineração promoveu o desenvolvimento da
mão-de-obra livre. Este fato se explica pelo crescimento das diferentes
profissões liberais e ofícios exercidos por homens livres, pelo altíssimo índice
de mortalidade dos negros escravos e porque nas faisqueiras a extração do ouro
era feita por brancos e mestiços livres e por negros que gozavam de
semiliberdade.
Mas o extraordinário crescimento da mão-de-obra livre num
país essencialmente escravista não alterou, em sua essência, o conjunto das
relações entre o branco e o negro.
É verdade que muitos escravos, trabalhando em regime de semiliberdade nas
faisqueiras ou em alguma atividade comercial, conseguiram acumular algum
dinheiro e comprar a alforria (liberdade). Contudo o trabalho do negro nas
grandes minas era sensivelmente pior do que nos canaviais. O índice médio de
vida útil do escravo nas minas era em tomo de cinco anos, pois era forçado a
trabalhar em buracos onde o ar era rarefeito e às vezes tóxico, dentro da água
ou atolado várias horas por dia na lama.
Isso significa que o negro permaneceu escravo, já que sua
possibilidade de libertação era praticamente nula. A existência de negros
libertos como Chica da Silva e Chico Rei não anula o exposto, dada sua
excepcionalidade.
Prova da continuada opressão e violência do homem branco
sobre o negro foi a formação de vários quilombos nas regiões mineradoras, como,
por exemplo, o do Rio das Mortes, em Minas Gerais, e o de Carlota, em Mato
Grosso. A escravidão, com tudo o que ela encerra de malévolo, duraria ainda mais
de um século.
Vida cultural e
desenvolvimento intelectual nas Minas Gerais
O século do
ouro foi responsável pelo desenvolvimento do interesse pelas "coisas da
inteligência ou do saber" entre alguns homens da elite urbana endinheirada,
principalmente de Minas Gerais, Bahia e Rio de Janeiro.
Como já vimos, os estudos superiores eram proibidos no
Brasil. Muitos senhores endinheirados mandavam seus filhos para estudar em
universidades européias, principalmente em Coimbra. Na Europa, eles entraram em
contato com as idéias filosófico liberais dos iluministas europeus e as
trouxeram para o Brasil, incrementando a vida intelectual, política,
administrativa e científica no século XVIII e pane do XIX.
A vida cultural nas Gerais desenvolveu-se principalmente em
torno das Igrejas e confrarias. Não sem razão, a arquitetura, a escultura sacra
e a música floresceram na região e deixaram imponentes registros do barroco
brasileiro.
Já na segunda metade do século XVIII, Vila Rica se
transformou no centro do arcadismo brasileiro, onde se destacaram nomes como
Tomás Antônio Gonzaga, Cláudio Manuel da Costa, Silva Alvarenga, Alvarenga
Peixoto e outros, líderes da Inconfidência Mineira, o primeiro movimento pela
libertação colonial.
A época de Pombal
(1750-1777)
Embora não
tenha alcançado plenamente seu objetivo de salvar Portugal da dependência
britânica, o ministro português Marquês de Pombal adotou várias medidas nesse
sentido.
Político sagaz e inteligente, Pombal pretendia anular os desastrosos efeitos do
Tratado de Methuen para a economia lusitana. Estimulou as manufaturas
portuguesas, que haviam sofrido um golpe de morte com a assinatura daquele
tratado, proibiu a exportação de ouro e combateu vigorosamente o contrabando.
Visando racionalizar a exploração da colônia para recompor a
economia da metrópole, o Marquês criou a Companhia de Comércio do Grão-Pará e
Maranhão e a Companhia de Comércio de Pernambuco e Paraíba, ambas dotadas do
direito de monopólio por vinte anos do comércio e da navegação naquelas regiões,
e suspendeu a livre navegação nas áreas de monopólios das ditas companhias.
A Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão estimulou a
produção de algodão, arroz, cacau etc., e tentou resolver o problema da
mão-de-obra escrava para a região fornecendo regularmente um certo número de
negros africanos. A Companhia de Comércio de Pernambuco e Paraíba, por sua vez,
estimulou a produção de cana-de-açúcar e tabaco.
A idéia de se criar uma companhia de comércio para o Rio de
Janeiro esbarrou na reação dos ingleses, que não admitiam perder a liberdade de
comerciar com a rica região escoadoura de ouro das Gerais.
As intenções centralistas e de fortalecimento do poder do
Estado metropolitano levaram Pombal a entrar em choque com uma parcela da
nobreza lusa e com a poderosa Companhia de Jesus, acusando os jesuítas de
estarem montando em terras brasileiras um império próprio.
Ao expulsar os jesuítas o Marquês empreendeu uma reforma no ensino, retirando
das mãos dos parires a educação escolar e colocando-a nas mãos de professores
leigos contratados e pagos pelo Estado. O nível do ensino no Brasil caiu
assustadoramente, pois os professores contratados pelo Estado para lecionar nas
escolas régias eram, em sua maioria, incompetentes e ignorantes. A conseqüência
foi o aumento da alienação e da superficialidade do ensino.
Ainda em relação ao ensino, Pombal fez uma reforma na
Universidade de Coimbra, introduzindo os estudos das ciências exatas e naturais
e aprimorando os estudos das ciências jurídicas.
Com o intuito de melhor controlar a saída do ouro e do diamante do Brasil e de
defender os interesses portugueses no sul da colônia, o Marquês transferiu a
capital do Estado do Brasil de Salvador para o Rio de Janeiro, em 1763.
A época do Marquês de Pombal foi marcada pelos excessos e
abusos de uma política fiscal rígida e opressiva. Além de criar para a colônia
inúmeros impostos complementares, ele violentou a população mineira ao instituir
a primeira derrama (1762-1763).
A derrama era executada quando a cota de 100 arrobas anuais
exigida como imposto sobre a extração do ouro não era completada. A
complementação das 100 arrobas era feita com requintes de crueldade. Pela
madrugada os dragões do Regimento das Minas sitiavam a vila onde os cobradores
de impostos executariam a derrama. Todo tipo de arbitrariedade era cometido para
forçar a todos, indistintamente, o pagamento do imposto devido. A última derrama
foi decretada em 1789, mas não ocorreu devido à Inconfidência Mineira.
Considerado na Europa como déspota esclarecido e influenciado
pelas idéias liberais da época, o Marquês de Pombal, em relação à colônia,
sempre foi um opressor radical.