Direitos
humanos defendem mais os bandidos, diz
pesquisa
Na opinião de
dois em cada três brasileiros, os
direitos humanos defendem mais os
criminosos que suas vítimas. Os dados
são de uma pesquisa inédita do instituto
Ipsos, obtida pela BBC Brasil.
Embora 63% se
digam genericamente "a favor" dos
direitos humanos, 21% se manifestam
contrariamente à mera existência deles.
As conclusões estão na edição 157 da
pesquisa Pulso Brasil. O Ipsos
entrevistou presencialmente 1,2 mil
pessoas em 72 municípios nas cinco
regiões brasileiras - as entrevistas
foram feitas entre os dias 1º e 15 de
abril.
A pesquisa
também revela um desconhecimento sobre a
real aplicação dos direitos humanos no
país. Enquanto 94% dos que responderam
afirmaram já terem ouvido falar sobre
eles, 50% admitem que gostariam de
conhecer melhor a questão.
"As pessoas
são a favor 'conceitualmente' do que
elas entendem ser os direitos humanos, e
do que elas gostariam que fosse a
aplicação deste conceito. Mas, do ponto
de vista da realidade concreta, elas
acham que hoje tais direitos servem para
defender bandidos", diz Danilo
Cersosimo, diretor do Ipsos e um dos
responsáveis pela pesquisa.
A ideia básica
dos direitos humanos é a de que todas as
pessoas - sem distinção - têm direito à
vida, à liberdade, à integridade física,
à saúde, à moradia, alimentação,
liberdade de expressão etc.
Trata-se de um
conceito muito antigo no Ocidente: a
maioria dos teóricos considera que a
primeira declaração formal dos DH do
mundo seja a Declaração de Direitos de
Virgínia, escrita nos EUA em 1776. O
documento mais famoso, porém, é a
Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão, ratificada na Revolução
Francesa de 1789.
Numa pergunta
para resposta espontânea (quando o
entrevistador não dá alternativas
pré-estabelecidas), 21% dos
entrevistados disseram que os direitos
humanos significam "igualdade de
direitos" ou de tratamento para ricos e
pobres, brancos e negros, etc. Logo
atrás, para 20%, o conceito se refere a
direitos de criminosos ou bandidos.
Em outra
pergunta, desta vez com alternativas
pré-definidas, a maioria (56%) disse que
"os bandidos" são os maiores
beneficiados pelos direitos humanos.
Outros 9% responderam "os mais ricos" e
só 9% citaram "toda a sociedade
brasileira".
Para Maristela
Basso, professora de Direito
Internacional na Universidade de São
Paulo (USP), a percepção brasileira de
que as garantias mínimas servem para
"defender bandidos" provavelmente tem
origem nos primeiros grupos a trabalhar
a favor da questão: as comissões de
direitos humanos da Ordem dos Advogados
do Brasil (OAB) nos Estados,
especialmente nos anos finais da
ditadura militar (1964-1985).
"Eram grupos
que se apresentavam como defensores da
dignidade e do devido processo legal
para todos, inclusive para os
presidiários, e aí ficou essa ideia de
que são pessoas que defendem bandidos",
diz ela.
Basso defende
que o tema seja tratado nas escolas e
nas famílias, para garantir que crianças
e adolescentes saibam do que se trata.
"Negar direitos humanos aos presos ou a
qualquer outra pessoa não te torna mais
protegido, pelo contrário. Quem nega os
direitos humanos está desprotegendo a si
próprio. Um dia, você ou uma pessoa
próxima pode ter os próprios direitos
ameaçados."
Estado não
garante os direitos da população
O levantamento
do Ipsos mostra, ainda, que os
brasileiros percebem a fragilidade do
Estado na hora de fazer valer os
direitos dos cidadãos: para 66%, o
governo brasileiro não garante
integralmente os direitos humanos da
população.
Outros 54%
concordam com a afirmação de que "os
direitos humanos não defendem pessoas
como eu" - o que a rigor é falso, já que
os direitos humanos, ao menos em tese,
se aplicam a todas as pessoas.
"As pessoas se
sentem desamparadas pelo Estado, e isso
não deixa de ser verdade no caso dos
direitos humanos. Há uma lacuna entre o
que elas esperariam que fossem esses
direitos, e o que elas percebem como
sendo a realidade (a defesa de
criminosos)", diz Cersosimo.
"A realidade é
que os direitos humanos sempre tiveram
esta imagem no Brasil. O resultado é
chocante, mas não chega a ser
surpreendente", avalia o sociólogo.
Na média, há
mais homens contrários aos DH (25%) do
que mulheres (21%), e a faixa etária que
menos apóia os DH é a de 35 a 44 anos
(23% contra). Em termos regionais, há
mais pessoas contrárias aos direitos
humanos na região Sul (29%, contra 21%
no Brasil como um todo).
( BBC Brasil)
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