Historia
Santa Rita de Cássia BA
A história de Santa Rita de
Cássia, município localizado na porção noroeste do estado da Bahia, remonta à
época do Brasil Colônia.
A chegada dos colonizadores
Não é possível determinar em que ano exatamente Santa Rita de Cássia foi
fundada, uma vez que não existem registros dos primeiros habitantes; somado a
isso, há também a questão do total desconhecimento da vida histórica da cidade
pela maioria de sua população, causado em parte pela omissão e pela falta de
interesse dos poderes competentes em levantar fatos da história local.
Tudo o que se sabe é que a história das primeiras comunidades presentes no oeste
da Bahia remonta às primeiras décadas do século XVII.
Entradas e bandeiras partiam de Salvador em busca de ouro, prata, esmeraldas,
diamantes e outras pedras preciosas no sertão, como as que os espanhóis tinham
achado em seus domínios além dos Andes. Abordando os índios de lábios e bochecas
ornados com tembetás coloridos, os primeiros povoadores da Bahia
perguntavam-lhes onde havia ouro e prata; o nativo, que desconhecia esses
metais, achando que se tratava de pedras coloridas comuns, tinha sempre
respostas afirmativas. Daí as decepções e as queixas dos exploradores contra a
suposta má-fé dos informantes.
Porém, o fator mais importante para a penetração das primeiras levas de
migrantes naquelas regiões ainda inóspitas foi o gado. Os grandes rebanhos
vindos do litoral iam avançando em direção às terras inexploradas, banhadas por
pequenos rios de águas claras, córregos e regatos.
Enfrentando dificuldades e constantes combates com os índios, os colonos foram
pouco a pouco se apossando das terras da margem esquerda do rio São Francisco,
estabelecendo núcleos de criação de gado, engenhos de cana-de-açúcar e
agricultura em geral. Em meados do ano de 1600, os colonos chegaram ao rio
Grande através de sua confluência com o rio São Francisco.
O primeiro afluente do rio Grande que encontraram foi o rio Preto, através do
qual chegaram à área onde viria a ser fundada a Vila de Santa Rita; acredita-se
que isso tenha ocorrido por volta de 1610.
Com as conquistas de novas áreas para pastagem, os índios locais foram
combatidos e, em muitos casos, foi feito um trabalho de catequização.
Cinco eram os povos indígenas que habitavam o oeste da Bahia antes da
chegada dos portugueses: os Acroás e os Xacriabás, que habitavam as margens do
Iaçu, nome dado por eles ao rio Grande; os Aricobés, que viviam um pouco mais ao
norte, na região onde hoje é Angical (município que fica ao sul de Santa Rita de
Cássia); os Craós, no Alto Rio Preto, entre Goiás e o Maranhão; e por fim os
Xerentes, que tinham sua principal aldeia localizada no lugar Pontal, na Serra
do Boqueirão, próximo ao local onde o rio Preto deságua no rio Grande, no
município de Mansidão.
Com a chegada dos colonizadores no início do século XVII, esses índios
tiveram suas terras invadidas e tomadas à força. Depois de muitos combates, a
população indígena ficou bastante reduzida, contudo não chegaram a ser
exterminados. Assustados, os silvícolas foram mudando suas aldeias de lugar,
sempre margeando rio acima; sabe-se que fixaram moradia pela última vez na
região num lugar denominado Aldeia, localizado às margens do rio Preto, no atual
município de Formosa do Rio Preto, então distrito de Santa Rita de Cássia. Os
Xerentes, já "civilizados", hoje em dia habitam o norte do estado do Tocantins.
Entre os líderes dessas campanhas de desbravamento destacam-se Domingos
Afonso Sertão, o Mafrense, e Francisco Dias D'Ávila Caramuru, neto de Garcia
D'Ávila, o Conde da Torre. Em meados do século XVII, esses dois sertanistas, que
ambicionavam se apossar das terras à oeste do rio São Francisco, conseguiram de
D. Afonso VI, então rei de Portugal, uma permissão formal para fazer guerra
contra os índios. Ambos ganharam patente militar, sendo Francisco Dias D'Ávila
nomeado coronel comandante e Domingos Afonso capitão do exército.
Outros bandeirantes que também passaram pela região foram: o paulista Domingos
Jorge Velho; Antônio Guedes de Brito, fundador da Casa da Ponte e Regente do São
Francisco; Antônio Dias Adorno; e o mameluco pernambucano Tamacuana, cuja
profissão era "sertanear".
Após o período das invasões holandesas no litoral nordestino, houve um
grande aumento no número de incursões pelo sertão baiano, que passaram a se
processar em escala maior, correspondendo essa expansão, em grande parte, à
necessidade de se ampliar a indústria do pastoreio para atender ao consumo cada
vez maior de carne dos grandes mercados da costa.
Somado a isso, foi nessa época que se deu a crise do ciclo da
cana-de-açúcar, decorrente do aumento da produção de açúcar nas Antilhas, com o
qual o açúcar brasileiro não conseguiu competir no mercado internacional. Os
grandes engenhos ficaram sem capitais para investir e com dificuldades para
aquisição de mão-de-obra, devido ao êxodo de escravos e homens livres, que se
deslocavam do Nordeste para o Brasil Central a fim de trabalharem na cata de
ouro e diamantes. Essa crise fez então renascer nos colonos o desejo de explorar
o interior da nova terra.
Combates constantes se seguiram, mas os colonos continuaram avançando,
estabelecendo-se pouco a pouco na região, que na época era conhecida como Sertão
de Rodelas. Navegando pelos rios Preto e Grande, eles iam penetrando cada vez
mais nos vales, chegando até a lagoa de Parnaguá, no atual estado do Piauí.
Ao longo do caminho, no rastro que esses sertanistas deixavam atrás de si após
sua passagem, foram surgindo arraiais e vilarejos, dentre eles o Arraial de
Santa Rita do Rio Preto.
O crescimento do arraial
É tradição lendária, uma vez que não existem provas documentais, que em
meados do século XVII, chegou ao Arraial de Santa Rita do Rio Preto um
misterioso casal de portugueses, que se instalou nas imediações da Igreja Velha,
então rua do Espírito Santo (atual avenida Professor Elpídio Santana).
Segundo a crença popular, eles permaneceram aproximadamente dez anos na
região e após esse período, sem maiores explicações, esse casal não identificado
simplesmente partiu dali para lugar ignorado, deixando, por esquecimento talvez,
uma imagem de Santa Rita de Cássia no casebre onde morou.
Existem versões no tradicional conceito do povo local, que afirmam que o
tal casal tenha sido morto pelos índios que habitavam à região; outras versões
contam que eles foram devorados por animais selvagens. Há também quem acredite
piamente que esse casal foi enviado por Deus com a missão de conduzir a imagem
de Santa Rita de Cássia (ou Santa Rita dos Impossíveis) para as margens do rio
Preto e depositá-la anonimamente no local. Daí o porquê do seu desaparecimento,
descartando assim as versões atribuídas aos índios e aos animais selvagens.
Ruínas da "Igreja Velha". Construído em estilo barroco por escravos, no século
XVII, o prédio da igreja foi parcialmente demolido em 1963.O fato é que a imagem
da santa foi realmente encontrada no casebre pelos novos colonos que ali
chegaram; entretanto, não foi encontrado qualquer vestígio de luta ou cadáveres
nas imediações. Naturalmente, o anônimo casal, cumprindo sua missão, tenha
regressado ao seu lugar de origem sem ser identificado, sem sofrer qualquer
ameaça ou agressão, "sob a proteção da santa".
Entre os novos colonos que sucederam o casal português, estavam: o
capitão-mor Ângelo Custódio da Rocha Medrado e seus descendentes; o índio
Francisco Rodelas, nomeado capitão em 1674; o capitão João de Araújo Costa,
natural de Olinda, Pernambuco; e José Pereira de Matos, que fundou a fazenda
Ribeira do Rio Preto, que mais tarde passou a se chamar Fazenda Santa Rita,
devido à imagem encontrada e para a qual foi erigida uma pequena capela.
A Fazenda Santa Rita, que posteriormente passou a ser propriedade de
Nicolau Gonçalves Franco, constituiu-se um grande núcleo de migrantes, o que fez
com que o arraial crescesse e prosperasse.
Em Carta Régia enviada ao então governador-geral do Brasil, D. João de
Lencastre, datada de 2 de dezembro de 1698, o novo rei de Portugal, D. Pedro II,
determinou que fossem fundados "núcleos de civilização" (ou "postos de
vigilância") nas bacias do rio São Francisco, do rio Grande e do rio Preto, para
atender aos pedidos dos habitantes locais que chegavam insistentemente à Lisboa,
solicitando segurança contra os ataques dos índios às suas fazendas e também
reivindicando maior presença na região de instituições que representassem o
Estado. Além disso, a metrópole percebeu a necessidade da presença de colonos
naquela região para garantir aos portugueses a posse das terras à oeste do rio
São Francisco.
Inicia-se assim a implantação/oficialização dos primeiros povoados na
região, em núcleos já habitados que existiam desde 1600: Pilão Arcado, na margem
esquerda do São Francisco; São Francisco das Chagas da Barra do Rio Grande do
Sul, atual Barra, na confluência do rio Grande com o rio São Francisco; Campo
Largo (atual Cotegipe), à margem esquerda do rio Grande, 80 quilômetros abaixo
de onde surgiria Barreiras; Vila de Nossa Senhora do Livramento de Paranaguá,
atual Parnaguá, junto à lagoa de mesmo nome, no Piauí; e Santa Rita do Rio
Preto, na margem esquerda do rio Preto. Mais tarde, por volta de 1700, surgiu a
comunidade de São João de Barreiras, atual Barreiras.
A ordem foi apenas um complemento, uma formalização para um movimento que
já estava se consolidando. Com o crescimento da atividade comercial entre Barra
e São João de Barreiras, barqueiros e aventureiros subiam o rio Grande e seus
afluentes explorando áreas desabitadas, o que culminou na formação de novas
comunidades. Os povoados prosperaram e foram durante muito tempo os principais
"núcleos de civilização" da região.
Porém, como os ataques dos índios continuavam, em 17 de dezembro de 1699
o rei português, D. Pedro II, autorizou a D. João de Lencastre, governador-geral
do Brasil, que fizesse oficialmente guerra contra os índios, assinando assim a
sentença de morte dos indígenas. As tribos foram praticamente dizimadas, com
exceção dos índios Aricobés, de Angical, que por serem de índole mansa, foram
poupados e posteriormente catequizados, primeiro por capuchinhos e depois por
franciscanos, carmelitas e jesuítas vindos de Salvador, iniciando-se assim um
trabalho educativo que se desenvolveu por toda a região. Apesar disso, a
perseguição sistemática contra esses índios continuou até a década de 30.
Embora no período colonial essa região fizesse parte da capitania de
Pernambuco, ela ficava geograficamente mais próxima à capitania da Bahia, por
isso foram os desbravadores baianos que, em combates com os índios, se apossaram
das terras da margem esquerda do rio São Francisco. Porém, Pernambuco não se
conformava com a perda de uma parte tão significativa do seu território, e após
mais de um século de reivindicações, obteve a reanexação, em caráter
administrativo, das terras da margem esquerda do São Francisco.
Em 1810, D. João VI, com a Família Real já no Brasil, criou, a pedido dos
pernambucanos, a Comarca do Sertão de Pernambuco nas terras à margem esquerda do
São Francisco, que mais tarde passou a chamar-se Comarca do São Francisco.
Por causa das revoluções separatistas que os pernambucanos fizeram em
1817 e em 1824 com o fim de se separar do Brasil e formar um país independente
que se chamaria Confederação do Equador, D. Pedro I, em represália, anexou
primeiramente a Comarca do São Francisco a Minas Gerais e posteriormente, em
1827, incorporou definitivamente toda a margem esquerda do São Francisco à
Bahia. Durante muito tempo rolou nos tribunais uma questão judicial entre a
Bahia e Pernambuco pela disputa desta área, que ficou conhecida como Região do
Além São Francisco.
Em 13 de julho de 1850, o Barão de Cotegipe apresentou à Assembléia
Provincial um projeto de sua autoria propondo a criação da província do São
Francisco, que seria composta pelas comarcas de Urubu (atual Paratinga), Barra,
Pilão Arcado, Sento Sé e Juazeiro, além das comarcas de Parnaguá, no Piauí, e de
Paracatu, São Romão e Januária, da província de Minas Gerais, mas o projeto não
vingou.
Até hoje, alguns dos seus habitantes ainda lutam e sonham com a criação
do Estado do São Francisco. Esta área hoje compreende a Região Oeste da Bahia,
que é onde está localizado o município de Santa Rita de Cássia.
Emancipação política
Crescendo rapidamente, o povoado de Santa Rita do Rio Preto alcançou
foros de freguesia com a criação da Paróquia de Santa Rita de Cássia, em 1804. O
primeiro "fabriqueiro" da nova igreja matriz do povoado foi Antonio Estácio de
Souza, por provisão de 8 de agosto de 1804, e o primeiro vigário foi o padre
Francisco Xavier Miranda, substituído em 1811 pelo padre Manuel Antônio Ribeiro.
Fato digno de registro na história local é a participação marcante do casal José
da Rocha Medrado e Rita Antunes Guimarães Rocha no processo de emancipação do
município. Na primeira metade do século XIX, foram eles que constituíram, sem
alarde demagógico, o alicerce básico em que foi assentados a edificação da vida
política de Santa Rita de Cássia.
Descendentes de velhos troncos proprietários da região, o tenente José da
Rocha Medrado e sua esposa, D. Rita Antunes Guimarães Rocha, proeminentes
agricultores e pecuaristas, donos de vastas glebas, ficaram empolgados e
embevecidos com o desenvolvimento que invadia o povoado, sobretudo com a chegada
de grupos de migrantes que vinham de plagas distantes, atraídos pela riqueza das
terras do vale do rio Preto e com o objetivo de se estabelecerem na região e
fazê-la prosperar.
No desejo ardente de um futuro próspero para o seu florescente rincão
natal, José da Rocha Medrado e D. Rita Antunes Guimarães Rocha começaram a
direcionar seus esforços para a emancipação política do povoado, que era então
subordinado ao município de Barra do Rio Grande. O processo emancipacionista
naturalmente carecia de obedecer ao tradicional ritual legislativo, considerando
prioritariamente o número de habitantes, prédios e rendas tributárias
satisfatórias às exigências pertinentes aos preceitos das leis vigentes.
Não obstante a chegada de grupos e mais grupos de colonos ao povoado,
esses não encontravam áreas urbanas destinadas à construção de suas residências.
Com isto, os colonos viam-se obrigados a migrarem para a zona rural, onde
facilmente adquiriam glebas de terras de veredas, que lhes permitiam a
edificação de moradias e a criação de roças de lavoura e pastagens para a
criação de gado, formando assim pequenas propriedades rurais e fixando ali mesmo
os seus domicílios. Estas pequenas propriedades foram se enfileirando céleres na
região central do território, e receberam mais tarde o cognome de Veredas.
Estes acontecimentos porém, frustravam a possibilidade do povoado auferir
condições urbanísticas para fazer jus ao processo de sua independência política.
Apesar do desenvolvimento habitacional e econômico da zona rural, o povoado, que
seria a sede do futuro município, decaía no contexto das normas satisfatórias às
exigências determinadas em lei, o que dificultava a consolidação do processo
emancipacionista.
Então, o casal José da Rocha Medrado e D. Rita Antunes Guimarães Rocha,
numa veemente demonstração de amor ao seu berço natal, tomou para si a missão de
levantar uma bandeira de lutas e sacrifícios em prol da independência do seu
povo, que apesar de ser dotado de idéias progressistas, carecia de consolidar a
emancipação política do seu território. De imediato, foi iniciado um grande
movimento propagandista de conscientização e de incentivo à aglomeração urbana
na sede do território, tudo, claro, sob a influência do casal Rocha Medrado. A
campanha obteve surpreendente êxito, e num curto espaço de tempo a bandeira
emancipacionista triunfou brilhantemente.
Em 26 de março de 1840, por meio da lei provincial nº 119, ocorreu
a emancipação política do até então povoado de Santa Rita do Rio Preto, que foi
elevado à categoria de vila, e cujo território foi desmembrado do município de
Barra do Rio Grande. Uma vez que essa lei é de fundamental importância para a
história do município, considera-se o ano de 1840 como sendo a data oficial de
fundação da cidade.
Santa Rita de Cássia foi o segundo município a ser criado na Região Oeste da
Bahia: o primeiro foi Campo Largo (atual Cotegipe), emancipado em 1820.
Apesar da aprovação dessa lei, a independência política de Santa Rita do
Rio Preto só foi concretizada em 3 de novembro daquele ano, com a instalação de
sua primeira Câmara de Vereança e com a eleição do primeiro intendente (antiga
denominação dada ao chefe do poder executivo municipal) pela maioria de seus
membros.
Dezenove foram os intendentes que governaram Santa Rita do Rio Preto até
a Revolução de 30, quando a figura do intendente deu lugar à do prefeito.
A consolidação do município
Santa Rita do Rio Preto, após sua independência política, e com os
poderes governamentais em franca atividade, passou a sobreviver sem a mínima
estrutura urbanística. Apesar dos esforços do casal Rocha Medrado para
concentrar as residências na parte urbana do povoado, eles conseguiram apenas o
suficiente para atender às exigências da emancipação. A municipalidade não
dispunha ainda de uma área territorial destinada ao incentivo de construções
habitacionais e comerciais no primeiro distrito sede, o que culminava na
paralisação do seu crescimento e fazia o recém-criado município regredir de
maneira assustadora. Os migrantes que lá chegavam, apesar do entusiasmo com a
fertilidade das terras, não encontravam campo adequado para o desenvolvimento de
suas atividades, fosse na esfera comercial ou na residencial. Os governantes se
sucediam frustrados, sem encontrar soluções para o desenvolvimento da cidade,
que cada vez mais era tragada pela inércia. Já pairava no ar a ameaça de uma
iminente desativação de sua emancipação política devido à estagnação do seu
desenvolvimento.
Surge então, mais uma vez na história de Santa Rita do Rio Preto, a
presença benemérita dos cidadãos José da Rocha Medrado e D. Rita Antunes
Guimarães Rocha, que sem medirem obstáculos e conseqüências da redução dos seus
bens, doaram à municipalidade, através da Câmara de Vereadores, um quarto de
légua das terras da Fazenda Santa Rita (incluindo aí a área onde estava
edificada a capela), com domínio onde hoje se acha edificada a cidade, cuja
escritura pública foi lavrada em 31 de agosto de 1860 pelo tabelião Venâncio
Antônio dos Santos Mártires; o imóvel foi havido pelos doadores através de
compra feita a José Pereira de Matos e sua esposa Cândida Maria da Soledade.
Com esse ato, eles conseguiram remover um obstáculo considerado
intransponível na concepção da comunidade já desesperançosa da manutenção do
município.
Após a transmissão dessa escritura, o município tomou novo rumo. A
esperança de um futuro próspero voltou a florescer em sua caminhada. De
imediato, a área doada ao povo foi sendo ocupada com edificações de prédios,
solidificando, portanto, a sua emancipação política já cambaleada pela inércia.
Como a vila ficasse a quase um quilômetro distante do rio Preto, separada
deste por alagadiços, José da Rocha Medrado empreendeu então a abertura de um
canal ou desvio do curso do rio, de forma a aproximá-lo do agrupamento urbano,
intento esse que levou adiante com êxito, usando para isso apenas recursos do
próprio bolso e deixando deste modo mais um inestimável melhoramento ao
município. Esse canal existe até hoje e presta serviços à população de Santa
Rita de Cássia, tanto como abastecedor de água, como se prestando também em
parte à navegação, por oferecer a esta porto seguro e pouco distante do bairro
comercial. O ato de abertura desse canal foi levado pela municipalidade ao
conhecimento da Assembléia Provincial.
Foi ainda José da Rocha Medrado que ampliou as comunicações entre Santa
Rita do Rio Preto e o estado do Piauí, realizando a abertura de boas estradas
para a sua fazenda Boa Esperança (fazenda essa que está situada na divisa da
Bahia com o Piauí), figurando, pois, como porta de intercâmbio de pessoas e
escoadouro das produções de cada um deles para o outro. Antes dele, somente o
Barão de Cotegipe tinha tido a iniciativa de mandar abrir estradas comunicando
as vilas do sertão baiano.
Com a proclamação da República, o município, já estruturado com a grande área
territorial urbana doada pelo casal Rocha Medrado (área essa que já estava
relativamente bem ocupada, em sua maior parte por construções residenciais),
tornou-se o ponto estratégico de encontro de caravanas oriundas de grande parte
do Piauí, norte de Goiás e sul do Maranhão, que buscavam mercadorias de
importação. A cidade conquistou movimento expressivo, nivelando-se rapidamente
entre os mais importantes centros da zona são - franciscana.
Século XX
O progresso de fato encetava sua consolidação em Santa Rita do Rio Preto
com a inauguração, em 25 de setembro de 1905, da Linha de Navegação Fluvial do
Rio Preto, através do vapor Alves Linhares (posteriormente denominado Jasen
Melo) da Viação Bahiana do São Francisco (em 1925, a viação contava com uma
frota de doze vapores e dez lanchas), que a princípio efetuava uma viagem por
mês entre a vila de Formosa do Rio Preto e Juazeiro, passando pelo porto de
Santa Rita do Rio Preto, num percurso de 759 quilômetros. Este acontecimento
acelerou expressivamente o desenvolvimento comercial da cidade, que obteve
condições mais amplas para atender às caravanas vindas dos estados vizinhos.
Um dos fatos mais importantes na vida histórica de Santa Rita do Rio
Preto foi a visita do governador José Marcelino de Sousa, em 1908. Compreendendo
a relevância dos interesses ligados à navegação do São Francisco, José Marcelino
teve em mente ampliar o curso das viagens dos barcos gaiolas (que já trafegavam
nas águas do rio Preto) para aumentar a capacidade dos minúsculos vapores, tão
visível era a insuficiência deles para o movimento de importação e exportação de
mercadorias. De Santa Rita do Rio Preto, ele prosseguiu viagem a bordo do vapor
Jasen Melo até o povoado de São Marcelo, a 60 quilômetros de Formosa do Rio
Preto. Em São Marcelo, José Marcelino inaugurou a extensão da linha de navegação
fluvial até esse povoado, na foz do rio Sapão, cujo curso havia sido previamente
desobstruído para esse objetivo. Nos anos que se seguiram, surgiram linhas de
navegação para Barra, Bom Jesus da Lapa, Cotegipe, Xique-Xique e Pirapora, em
Minas Gerais.
Entre os anos de 1903 e 1908 se deu o auge da exportação da borracha de
maniçoba em Santa Rita do Rio Preto, quando esse produto atingiu seus melhores
preços no mercado. Nessa época, a cidade conheceu um grande desenvolvimento
econômico, com o crescimento assombroso do número de estabelecimentos comerciais
e de suas indústrias, tornando-se assim uma das melhores praças comerciais da
região.
Porém, o ciclo de crescimento econômico de Santa Rita do Rio Preto foi
interrompido, não só pela súbita queda do preço da borracha de maniçoba, como
também, e principalmente, por causa da morte do coronel Taciano Rodrigues de
Araújo, então chefe político do município, que foi assassinado por seus
adversários políticos em 15 de agosto de 1909. A resposta veio logo em seguida:
em 18 de agosto do mesmo ano, parentes e amigos do coronel Taciano Rodrigues de
Araújo se envolveram no assassinato do coronel Francisco Sidney da Costa, a quem
julgavam ser o mandante da morte deste. Estes atentados suscitaram novos desejos
de vingança por parte dos adversários, resultando daí uma longa série de crimes
praticados de parte a parte pela liderança política do município. As sangrentas
lutas armadas entre facções políticas, ocorridas tanto em Santa Rita de Cássia
quanto em Formosa do Rio Preto durante a primeira metade da década de 1910,
época do coronelismo de sertão, ficaram conhecidas como Barulhos.
Foi a partir dessa época que começou o lento declínio de Santa Rita de
Cássia frente às demais cidades da região, declínio esse que se acelerou no
início dos anos 70, mantendo a cidade sempre aquém de suas possibilidades de
desenvolvimento até hoje.
Pelos decretos estaduais nºs. 7455, de 23 de junho de 1931, e 7749, de 23
de julho do mesmo ano, Santa Rita do Rio Preto teve seu nome alterado para Rio
Preto. Nessa época o município perdeu o território do Jalapão, que passou a
pertencer ao estado de Goiás, com a denominação de Porto Nacional.
Mais tarde, em 1943, em virtude do decreto-lei estadual nº 141, de 31 de
dezembro, o município de Rio Preto passou a se chamar Ibipetuba, que em tupi
significa banco de areia. A partir de 1957, Ibipetuba passou a se chamar Santa
Rita de Cássia, nome que ostenta até hoje.
Um dos acontecimentos históricos de maior importância para o município de
Santa Rita de Cássia ocorreu na gestão do prefeito Anibal Rodrigues de Araújo,
através do decreto-lei nº 311 de 2 de março de 1938, assinado pelo presidente
Getúlio Vargas, que elevou a sede do município à categoria de cidade.
Com a inauguração de Brasília, em 1960, o desenvolvimento de Santa Rita de
Cássia tomou novo impulso, uma vez que a Região Oeste da Bahia passou a ter
acesso às rodovias que levavam à nova capital e, conseqüentemente, aos grandes
centros urbanos do Sudeste.
Em 1961, Santa Rita de Cássia perdeu grande parte do seu território
devido à emancipação de Formosa do Rio Preto, que deixou de ser um distrito
subordinado à Santa Rita de Cássia para se tornar sede do município de Formosa
do Rio Preto.
No final de 1980 ocorreu uma grande enchente no rio Preto devido ao
volume excessivo de chuvas que a região recebeu naquele ano. A enchente, que
deixou Santa Rita de Cássia parcialmente inundada, destruiu o antigo cais da
cidade (construído na década de 50) e arrancou o calçamento original de muitas
ruas, além de ter arruinado lavouras e deixado várias pessoas desabrigadas.
Demorou meses até que as águas finalmente se recolhessem ao leito do rio.
Em 1985, o município de Santa Rita de Cássia sofre nova perda
territorial, dessa vez por causa da emancipação política de Mansidão.
Curiosidades
O município de Santa Rita de Cássia teve papel importante no combate aos
revoltosos da Balaiada, com a expedição de homens e armas, que para lá seguiram
intrepidamente para reprimirem a revolta, conjuntamente com forças de Barra e
Campo Largo.
Em meados do século XIX, começa a germinar em todo o Brasil a semente do
movimento republicano, e com o município de Santa Rita do Rio Preto não poderia
ser diferente. As idéias republicanas estavam em voga entre pequenas parcelas da
sociedade civil e eclesiástica, que há muito já estavam descontentes com o
regime monárquico. Em 1842, a paróquia de Santa Rita de Cássia tinha como
vigário o barrense João de Oliveira Costa, que doutrinava os sentimentos
republicanos através da sua eloqüente oratória sacra. O seu entusiasmo pela
causa chegou ao ponto de ser invadido pela emoção. Numa grande concentração
religiosa realizada em Campo Largo, o destemido padre pronunciou um eloqüente
sermão em protesto aos atos delituosos do Segundo Reinado, na frente de uma
expressiva multidão, oriunda de vários lugares do oeste baiano. A gravidade do
seu pronunciamento, que chegou a ser considerado subversivo, teve repercussão
negativa no alto escalão do governo. Graças à intervenção de autoridades
influentes no governo em favor do padre João de Oliveira Costa, a punição que
ele recebeu foi branda, se limitando apenas a uma drástica repreensão do bispo
de Olinda, Dom João da Purificação Marques Perdigão.
Não só de grandes feitos em benefício do povo de Santa Rita de Cássia
ficou marcada a trajetória do tenente José da Rocha Medrado. Como todo bom
caudilho, José da Rocha Medrado também tinha em suas costas o peso de algumas
mortes por interesses políticos. Dentre os crimes atribuídos à ele, o mais grave
foi a morte do alferes José da Rocha Menezes, durante as eleições de 1856. Certa
vez, o presidente da província, Álvaro Tibério de Moncorvo Lima, fez referência
à José da Rocha Medrado num discurso seu na Assembléia Provincial, da
seguinte maneira: "Já infelizmente celebre por crimes da mesma gravidade, á
frente de um grupo de faccionorosos como elle, assasinou o alferes José da Rocha
Menezes, o mais abastado fazendeiro do lugar o qual achava-se em sua propria
casa na visinhança da villa. Dominando pelo terror os juizes do local, fez
instaurar um processo adrede combinado para deixar cahir a culpa em outro
individou que se diz fôra posteriormente assassinado no territorio da provincia
de Goyaz." O presidente fez seguir uma força de cem praças sob o comando
do capitão do 7º de infantaria Francisco Antonio da Fonseca Galvão, que, ainda
em junho, conservando-se em Vila Nova, foi substituído nesse comando pelo
capitão Manoel da Cunha Wanderley Lins. Em seu livro "História da Bahia: da
independência à República" (p. 203), Braz Amaral informa que o Visconde de
Sinimbu, em correspondência com o governo imperial, a propósito desse
assassinato do alferes José da Rocha Menezes pelo tenente José da Rocha Medrado,
declara, como presidente da província, não ter força militar para mandar àquele
longínquo sertão, acrescentando que, mesmo no caso de tê-la, hesitaria em se
servir dela pelo exemplo do passado que indicava ser esta uma providência inútil
para a justiça e que só serviria de pretexto para novos abusos e crimes. "Sobre
os negócios de S. Rita disse-me o presidente na primeira entrevista que tivemos,
depois de minha chegada, que nada podia fazer por falta absoluta de força
disponível e que já neste sentido havia oficiado ao ministério: vejo-o, porem,
tão descansado, que não sei o que pense." (carta de Abílio César Borges ao Barão
de Cotegipe, 4 de março de 1857). O assassinato de José da Rocha Menezes acabou
por definir o resultado das eleições para deputado em Santa Rita: o
desembargador Francisco Marianni, que era apoiado pelo Barão de Cotegipe, foi
derrotado, cabendo a vitória ao candidato Francisco Luiz Antunes de Campos, o
Militão.
Dentre os muitos assassinatos ocorridos na época dos Barulhos, o que mais
ficou marcado na memória do povo santa-ritense foi o do padre João de Oliveira.
Em virtude de motivos políticos, ele foi brutalmente assassinado a duas léguas
da sede do município, num lugar chamado Boca da Catinga, logo após ter partido
numa viagem para Salvador. Desde então, esse lugar tem fama de ser assombrado.
Os habitantes locais dizem que ainda é possível ver as gotas do sangue do padre
que caíram sobre a terra. No entanto, todos evitam passar por lá, principalmente
à noite, a não ser que estejam em grandes grupos.
Entre 1934 e 1936, Frederico Ribeiro Fidélis governou como prefeito
de Santa Rita de Cássia nomeado pelo interventor do Estado. Em 1936 surgem as
primeiras eleições municipais diretas. Persuadido de que não poderia concorrer
ao cargo que já ocupava, Frederico Ribeiro parlamenta com o Dr. Nascimento de
Jesus, seu amigo, e acerta a candidatura deste ao cargo, quando recebe um
telegrama do capitão Juracy Montenegro Magalhães, na época interventor da Bahia,
e do deputado Manuel Novais, informando-lhe da constitucionalidade de sua
candidatura ao cargo de prefeito. Com isso, Frederico Ribeiro foi candidato
único, mas governou por apenas mais um ano, devido à instalação do Estado Novo e
à nova constituição, quando o presidente Getúlio Vargas derrubou as eleições
para prefeito e governador, mergulhando o país num regime ditatorial com a
nomeação de prefeitos.
O primeiro avião a aterrissar no solo santa-ritense foi levado pelo então
prefeito Abdiel dos Reis, que regressava de uma viagem sua ao Rio de Janeiro, em
1940. Foi ele também quem levou para lá o primeiro rádio. O rádio era ligado em
uma bateria de carro, e quando começava a funcionar, atraía uma multidão de
curiosos, que se acercava da residência de Abdiel. A primeira bicicleta, o
primeiro caminhão, as primeiras indústrias de beneficiamento de arroz, algodão e
milho, e o primeiro serviço de alto-falante da cidade são outras das muitas
novidades que o prefeito Abdiel apresentou à Santa Rita de Cássia.
Em toda a história de Santa Rita de Cássia, apenas uma mulher
esteve no comando da prefeitura: Vicentina da Cunha Guedes. Ela, que exercia as
funções de tesoureira da prefeitura, assumiu o cargo de prefeita por decisão
judicial em substituição ao prefeito Frederico Ribeiro Fidélis, que faleceu em
pleno exercício do seu quinto mandato. Vicentina governou de julho de 1959 a
outubro de 1960.
No início de 1963, por ordem do então prefeito Altino Lemos Santiago, a
"Igreja Velha" foi parcialmente demolida. Ele achava que as paredes históricas
do templo estavam sendo um apêndice em sua administração, por isso, sem mais
delongas, autorizou a demolição do prédio, sem que a Câmara Municipal de
Vereadores da época apresentasse a mínima reação a esse ato. Na execução da
demolição do monumento histórico, a prefeitura gastou dos cofres públicos o
dobro do que teria gasto para recuperá-lo. Porém, o prédio não chegou a ser
totalmente destruído, devido aos protestos de alguns poucos cidadãos mais
esclarecidos e ao arrependimento do próprio prefeito Altino, que após meditar
sobre sua ação destruidora, chegou à razão, reconhecendo seu imperdoável pecado
administrativo e mandando parar as máquinas enquanto a demolição ainda estava em
curso. A maioria das paredes permaneceu intacta, apesar de o telhado da igreja
já haver sido desmoronado pelo tempo. Há até quem afirme com segurança que as
poucas telhas que estavam em bom estado de conservação foram retiradas de lá na
calada da noite do dia anterior à demolição, e que elas ainda existem nas
coberturas de algumas casas da cidade.
Somente na segunda gestão do prefeito Elói Barbosa Guedes (1977 - 1983),
é que surgiu a figura do vice-prefeito. O primeiro vice-prefeito da história de
Santa Rita de Cássia foi Antônio Batista Lopes.
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